segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

ANIVERSÁRIO DE KAIRÓS




No mês passado, este blog completou um ano em atividade. Foram 55 postagens que receberam mais de 5000 visitas, numa média de 416 por mês, embora só constem 14 seguidores. Não sei se foi muito ou pouco, mas a natureza dos assuntos, aponta para visitas ou pesquisas qualificadas, já que do blog estão excluídos assuntos especializados em áreas chamativas e polêmicas expressando apenas minha visão pessoal, original.

Tal como o deus grego Kairos, que se refere à qualidade e não à quantidade dos momentos vividos, acredito que os buscadores desejavam algo assim, quando iniciaram suas buscas. Aqui chegaram utilizando palavras chaves como Kairos,charadas difíceis, manias de escritores, curso de matemática, genealogia, banqueiro século XIX, Gigliola Cinquetti, traição de Francesco Burlamacchi,  e a própria denominação do blog, dentre outras.

As visitações foram encaminhadas predominantemente a partir do www.google.com.br (1.794), seguido de www.facebook.com (157), sitio onde compartilho cada nova postagem. Outras vieram de outros sites de busca, do Orkut e de blogs pessoais. Originaram-se principalmente do Brasil (4.397), seguido pelos Estados Unidos (214) e Portugal com 153 visitações. 

O maior número de visitações ocorreu no mês de agosto (638), seguido pelo mês de outubro (629) de 2011. O mês de menor número de acessos foi novembro de 2010, quando o blog iniciava (99).

Cinco postagens foram mais populares: VECCHIA AMERICA (588 visualizações), O TIJOLÃO DO PROF. MANUEL JAIRO BEZERRA (340 visualizações), A CHARADA É UM POUCO DIFÍCIL, (3,2) (199 visualizações), OS LIVROS DA EDITORA MIR (163 visualizações) e 2011 - ANO DA ITÁLIA NO BRASIL com 95 visualizações. 

Foram feitos 45 comentários. Os posts mais comentados foram INESPERADO REENCONTRO COM O XADREZ, e O ABUSO DO POLITICAMENTE CORRETO, ambos com oito comentários.

No fundo, cada postagem teve a intenção de servir culturalmente. Muito obrigado.







terça-feira, 6 de dezembro de 2011

SOBRE O PECADO


Por mais afastados que estejamos dos assuntos religiosos, não nos podemos furtar da reflexão sobre esse tema, e quer nos orientemos ou não, nos variados atos do drama humano, pela vertente religiosa, no fundo, será sempre pelo norte ético que nos guiaremos. Se assim não procedermos, se ferirmos mores e costumes, pagaremos com o julgamento da consciência, porque dentro de cada um de nós existe o conhecimento do bem e do mal. A sanção, o castigo, vem, pois, primeiramente de nós mesmos.
 
Na minha teoria pessoal do pecado, vejo-o caracterizado de duas maneiras: primeiro como algo que direta ou indiretamente prejudica alguém; e em segundo lugar, ligado ao velho conceito hebreu de idolatria, no sentido de escravidão a algo que nos afasta da nossa missão mais essencial, nos prejudicando. Aliás, não é outra coisa que se acha expressa nos ensinamentos religiosos.

Expliquemos nosso raciocínio com a importantíssima questão do sexo. De duas formas será pecaminoso: se praticado sem o desejo e o consentimento dos envolvidos na relação, ou quando se transforma em atividade reificada, principal dos indivíduos. Fora disso não há pecado.

No primeiro caso, faltando o desejo e o consentimento, estará caracterizado o estupro, a prostituição ou a traição. Na segunda forma é caso típico de idolatria, como também o é o exagerado apego ao dinheiro, ao poder, à alimentação e a tudo que impeça ou perturbe a realização da nossa essência, que para o religioso significaria amar a Deus sobre todas as coisas. Em ambos os casos fere-se alguém.

A literatura bíblica afirma que todos os pecados serão perdoados, menos aqueles cometidos contra o espírito. E também que somos templos desse espírito, que entendo como dignidade humana, o que há de mais profundo e significativo dentro de cada um de nós.

O castigo da idolatria não será a descida de fogo do céu para matar o pecador, mas a sensação de enfraquecimento espiritual, o sentimento de que nos afastamento do nosso centro, de que desperdiçamos a existência em desvios malsãos. O castigo por ferir o semelhante deverá ser de âmbito da moral, do sentimento de culpa e da justiça, e que no final também ocasionará prejuízos ao espírito. Assim, acredito que o pecado seja de natureza relacional (eu, comigo mesmo, ou com você). 

Embora não seja necessária a admoestação religiosa para evitá-lo, ouçamos as lições dos sábios sobre isso. Conta-se que alguém que desejava converter-se ao judaísmo pediu que o muito célebre Rabi Akiva recitasse toda a Lei, enquanto permanecesse sobre um dos pés. Não faças aos outros o que não queres que te façam, essa é a Lei, e tudo mais é comentário, teria sido a resposta do sábio.

Na mesma linha de pensamento, da qual, aliás, não poderia fugir, pois também era judeu, o Rabi Jesus recomendou que amássemos o próximo como a nós mesmos e a Deus acima de tudo. Em ambos os casos o que se pede é em primeiro lugar o respeito à própria dignidade pessoal, e em segundo, que se respeite a alheia: ame-se para amar o próximo. Observando ambas as recomendações estaremos, sobretudo respeitando o divino que há em nós e que no pecado é maculado. Nada mais se pode acrescentar sobre o assunto.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

DIÁRIO DE UMA CRIANÇA CONFUSA

Hoje meu amigo Gabriel disse na escola, pra mim e pro Rafael, que ele tem um caderno que diz que é um diário. Ele não deixa ver. Daí me deu vontade de ler seus segredos. Meu pai não quer que eu vá brincar com ele na sua casa por que ele tem dois pais, um tem bigode e o outro não tem, parece uma mulher. Não sei por onde anda sua mãe. Minha mãe riu quando uma vez eu perguntei por que Gabriel tinha dois pais e eu tinha um pai e uma mãe. As vezes eu fugia  e ia brincar com ele.  Jogávamos bola com o pai de bigode e com outros meninos no quintal. As vezes brigávamos. Um dia Rafael brigou com Gabriel por causa de um gol, pois a bola não tinha entrado. Nesse dia o pai de bigode não estava, foi então que Gabriel bateu em Rafa, e Rafa disse que os pais dele eram viados e ele também. Gabriel bateu de novo nele, mas chorou depois. Na escola fizeram as pazes e ficamos juntos novamente. 


Um dia Rafa roubou o diário de Gabriel e me chamou pra ler escondido. Eu queria saber seus segredos, fui ler. Mas Gabriel descobriu, seguiu a gente e tomou de volta seu caderno. Só deu pra ler algumas partes. Ele não sabe escrever, só diz os dias.

 “Dia 25. Meu pai me ensinou a brincar no seu computador, mas foi rápido, chegou meu outro pai, se beijaram, desligaram o computador e foram para a cozinha. Ouvi meu pai dizendo; faça a barba homem que assim me fere... ”

“Dia 12. Tomamos banho todos juntos, nus. Eles notaram que eu estava olhando muito pra ... eles, então começaram a brincar comigo jogando água... e fizeram cócegas. Depois fomos comer pizza. Um dos garçons é amigo do meu pai. Ele chamou um dos meus pais de menina. Ele disse: calma menina! Meus pais brigaram no carro, pois um disse que o outro estava olhando muito pra não sei que rapaz. Daí o outro disse: e você, pensa que não sei de você e Michel? Trouxemos uns pedaços de pizza pra casa, mais comemos no caminho.” 

“Dia 25. Sonhei que um monstro estranho e colorido me perseguia. Devo ter gritado, pois quando acordei meus pais estavam lá comigo e disseram para dormir de novo. Cada um me beijou e me cheirou. Agora lembro que, no sonho eu tinha uma mãe.” 

“Dia 07. Ontem foi dia de festa aqui em casa. Meus pais convidaram um monte de gente. Alguns dos amigos trouxeram seus maridos ou namorados. A Anna também veio. Não gosto dela. Ela só quer tudo pra ela e me arranha e eu não posso bater nela. As mães dela, Elisa e Mary Ellen, me disseram, no meu ouvido, que se eu bater nela eu apanho. O John, amigo de meus pais, olha muito pra mim, acho ele horrível com aqueles brincos, cabelo colorido e calças apertadas. - Que garotinho lindo - ele sempre diz - vem cá pra eu ti dar um beijo amor! Eu sempre corro dele. As vezes ele traz garotos com ele, sempre novos garotos. Um dia perguntei se eram filhos dele, meu pai disse que não. Meu outro pai riu muito e disse que eu fosse brincar.

“Dia 20.Briguei com o Rafa, bati nele, ele disse que meus pais são viados, bati então com mais força nele. Tenho ódio. Pensei que ele era meu amigo”.

“Dia 05. Fui estudar na casa do Pedrinho. A mãe dele fez suco e sanduíches. Estudamos até as cinco horas. A irmã dele é muito bonita e tem um cheiro muito bom. O pai dele chegou do trabalho e brigou com Pedrinho por ter desarrumado suas coisas. Depois ouvi ele dizer baixinho pra mãe de Pedrinho: - que é que esse viadinho tá fazendo aqui em casa? A mãe dele disse: homem não diga isso, ele pode ouvir, coitado.”

“Dia 30. Tive outro sonho com o monstro colorido. Como sempre ele corria pra me pegar. Não vi minha mãe dessa vez. Acordei e corri pro quarto de meus pais e vi que estavam nus e um estava em cima do outro...”

Foi só o que deu pra ver no caderno. Acho Rafael muito mal, pois ele disse que ia contar pra todo mundo. O Gabriel chorava muito e gritava e saiu correndo com o caderno.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

O QUINTO MILAGRE


Segundo os físicos, nosso corpo, e também o de todos os demais seres vivos, é um sistema aberto. Temos que retirar energia do ambiente para fazê-lo funcionar, e como numa máquina, há perdas, há dejetos. Já nascemos com certos controles que são acionados automaticamente nos momentos certos, a fim de que possamos manter o sistema. O produto final é a sobrevivência. Somos cheios desses controles que nos incitam à ação durante toda a nossa curta vida. A alguns deles chamamos de instintos.

O fluir da energia através do sistema causa desgastes nas peças utilizadas. Vão ficando velhas, usadas, quase imprestáveis. O pessimista Eclesiastes, escrito por Salomão, talvez num daqueles dias terríveis, em que tudo deu errado lá pelo reino, pinta o quadro sintomático da decrepitude humana (Ecles. 12:3) 

...no dia em que tremerem os guardas da casa, os braços, e se curvarem os homens outrora fortes, as tuas pernas, e cessarem os teus moedores da boca, por já serem poucos, e se escurecerem os teus olhos nas janelas...

Mas elas, as peças do corpo, não se desgastam todas por igual. Algumas vêm com defeito de fábrica, outras são mais ou mal utilizadas, e com a falência completa daquelas importantes, o sistema cessa de funcionar. Costuma-se denominar o desgaste contínuo, de envelhecimento, e o cessar da atividade do sistema, de morte.

O que fizemos durante todo esse tempo em que a energia fluiu pelo sistema? Resposta simples: vivemos, seja lá o que for que isso signifique para cada um.

Na morte, com o retorno dos elementos à terra de onde saíram, enxerga-se com mais clareza a degradação do corpo, a aparente vitória final da entropia, do caminho sem retorno delineado pelas leis da termodinâmica. Em um poema, dizia meu avô Tibério Burlamaqui diante dessa idéia:

Quando contemplo a sordidez dum verme
No baixo chão, nas cousas deletérias,
Das cloacas, dos monturos, das misérias
Da carne humana putrefata, inerme

Sinto um frio mortal pela epiderme
E ante o evoluir e força das matérias,
Creio e descreio em deduções bem sérias
Tremo com medo que meu corpo enferme

Contudo, mesmo o olhar mais displicente sobre o esquema acima, caracterizado por nascimento, crescimento e morte, deixa ver uma contradição fundamental entre a entropia, ou seja, o irreversível avanço para a desordem cada vez maior, e a vida, que atua exatamente no sentido contrário - a negentropia. E vem à mente uma questão, não sobre a manutenção organizacional de um ser vivo, mas sobre o momento exato do surgimento da vida: como foi possível surgir no Universo, algo que contraria frontalmente a segunda lei da Termodinâmica? E mais, como se manteve a despeito dela? A resposta não tem sido fácil e não é possível contornar o problema.

Há muito tempo que os experimentos de Stanley Miller e as idéias do sábio russo Oparin perderam sua importância. Em 1985, Leslie E. Orgel, em As Origens da Vida, ainda percorre os mesmos caminhos da formação de compostos pela ação de relâmpagos, da energia ultravioleta, das ondas de choque iniciais, chegando ao ponto chave: O principal problema intelectual apresentado pelas origens da vida está relacionado...a evolução da organização biológica. É isso mesmo, a solução não está no instante em que se formam tal ou qual aminoácido, mas ao surgir um mecanismo complexo como o da fotossíntese ou da respiração, altamente organizado e completamente contrário ao esperado. Afinal de contas, os relâmpagos, ondas de choque, etc, parecem ser muito mais agentes da entropia que o contrário.

Em 1997, Robert Shapiro, autor de outro livro especializado sobre o assunto, Origins: a Skeptic’s Guide to the Creation of Life on Earth, nada conclui, senão que:

Não conhecemos a receita essencial – o conjunto de ingredientes especiais e as formas de energia capazes de conduzir sistemas químicos pelo caminho da organização, nos primeiros passos da vida.

Esse caminho da organização, remando contra a maré da entropia, é que é o problema.

Mais tarde, em 2002, Paul Davies, em O Quinto Milagre – Em busca da origem da vida, diz que Parecemos estar diante de uma contradição perturbadora, e admite que a vida deve ter surgido através de um evento singular, que denomina brecha na entropia, sugerindo que a instabilidade gravitacional surgida logo após o Big Bang, seria responsável pela brecha, fazendo as coisas caminharem no sentido inverso à termodinâmica, até o surgimento da vida. Admite porem, que:

Fazer a fonte de informação remontar à gravitação e ao estado homogêneo do universo pouco depois do Big Bang, ainda nos deixa com o problema da semântica. Como foi que surgiu a informação significativa no universo?

Mais adiante capitula:

O que ainda falta explicar – o que sobressai como o enigma central não resolvido na explicação científica da vida – é o modo como o primeiro micróbio passou a existir”

O que dirá sobre o assunto, o arrogante Richard Dawkins, autor de Deus – um delírio (2007)? Na verdade ele nada tem a dizer, admitindo mesmo sua ignorância sobre a Química, que julga responsável pelo esclarecimento da questão. Mas admite a quase improbabilidade do surgimento da vida, para logo em seguida ensaiar uma explicação probabilística considerando o tamanho do universo.

Até agora, a verdade é que continua valendo a palavra de Jules Carles, no seu livro As Origens da Vida, quando afirmava em 1984, que a passagem da matéria inanimada à vida, fica por explicar e é mesmo cientificamente inexplicável. 

E o meu avô Tibério, sem fazer essas reflexões científicas, terminou intuitivamente seu poema negentrópico: 

Penso depois, talvez com fundamento,
Que dentro de mim mesmo alguém labuta,
Contra o invol’cro carnal e entendimento

É minha alma, Senhor, alma impoluta
Que um dia ascenderá ao firmamento
Livre da terra e da matéria bruta



sexta-feira, 14 de outubro de 2011

ANGÚSTIA ALIMENTAR

Se os nossos ancestrais tiveram problemas com alimentação, foram de natureza diversa daqueles que enfrentam hoje os que a duras penas conseguem o pão cotidiano. É questão indigesta essa da alimentação, pois se tornou difícil escolher o que comer, considerando todas as informações disponíveis. Muitas surpresas se encontram à espreita, nos textos sobre o assunto. Para começo de conversa, todos os alimentos apresentam contra indicações. Incrível, mas é verdade Vejamos alguns exemplos.

O brasileiríssimo feijão, preferido por nove entre dez comedores do país, deve ser consumido com cautela. Primeiro porque, juntamente com frutas e verduras, a leguminosa esta mais enriquecida de resíduos tóxicos, que de nutrientes, e depois, algumas variedades, segundo se lê, apresentariam lecitinas e antitripsina, substâncias com alto poder tóxico que podem levar até a morte. A lectina é uma proteína que causa sérios danos nos mamíferos, como por exemplo a aglutinação de hemácias, e a antitripsina atua de modo a impedir a formação de algumas enzimas importantes para a digestão, entre elas a tripsina.Claro que o cozimento diminui o problema, mas não totalmente. Dispensemos o feijão. Imagine feijoada, cujos componentes adicionados fornecem colesterol e aditivos químicos suficientes para desencadear maléficos processos fisiológicos. Você só consegue piorar esse quadro acrescentando farinha de mandioca, incrementando o processo fermentativo e a produção de gases. Uma beleza!

Arroz, só se não estiver descascado, ou seja, serve apenas o famoso arroz integral, o único que nutre. Carne nem em sonho, ou melhor, pesadelo, pois estão cheias de anabolizantes, além de sua riqueza em putrecina, dentre outras substancias não menos assustadoras, que sugestivamente nos levam à certeza de estar deglutindo um delicioso cadáver.

Prosseguindo nesta linha de análise, pouca coisa vai sobrar. Leite de vaca, nem pensar. Cada mamífero na sua têta. Na vaca só o bezerro, pois as imunoglobulinas podem provocar reações alérgicas em espécies diferentes. Nas proteínas do leite de vaca existem mais de 30 sítios alergênicos, que podem causar problemas como diarréia, cãibras, sangramento gastrointestinal, anemia, erupções cutâneas, arteriosclerose, acne, leucemia, esclerose múltipla, artrite reumática e cáries dentárias. De contra peso o excesso de cálcio pode desandar em cálculos renais e biliares.

Agora imagine o perigo que corremos ao tomar leite com pão e margarina. Verdadeiro atestado de óbito. Além de aumentar a taxa de colesterol, o freguês ainda engole bromato de potássio, capaz de afetar seus registros mnemônicos. E não é só isso. O bromato, durante o cozimento da massa do pão, é convertido em brometo, que é cancerígeno. Quanto a margarina, não fique temeroso de que ocorra alguma explosão no seu manuseio, só porque na sua composição entra um explosivo – o ácido butil hidroxitolueno, parente próximo do TNT. Pelo menos até agora não há notícia de que tenha acontecido. Tampouco os terroristas andaram comprando grandes quantidades de margarina para construir bombas. Quem sabe o ácido sulfúrico, a soda cáustica, e o ácido benzóico, utilizados na fabricação evitem o evento explosivo.

Pelo que se conhece, nem o regime ovo-lacto-vegetariano escapa. Se o lacto pode causar alergia alimentar e cálculos, e os vegetais estão sem dúvida envenenados, poderiam os ovos nos salvar dessa verdadeira conspiração alimentar contra a humanidade? Ledo engano. Também não pode. Os caipira são verdadeiras bombas de colesterol e os de granja nem ovos são, mas óvulos, riquíssimos, segundo se afirma, de antibióticos e hormônios. Agora se o caro leitor desejar se aventurar, por favor, não coma com sal, pois a este se atribui um grande número de males, sendo enfadonho listá-los neste momento.

Há, porém, segundo me asseguram, uma solução simples e ao alcance de todos: a mastigação. Sim, afinal, para que você quer os dentes que sobraram depois de tanto comer açúcar? O ideal é mastigar de 100 a 150 vezes o bocado que se tem na boca. Não se preocupe se não conseguir no início. Espelhe-se nos Macrobióticos. Há quem já tenha conseguido mastigar 1300 vezes um pedaço de cebola. Pela teoria, depois de 150 vezes, não interessa mais o tipo de alimento, pois estes se transmutam em qualquer elemento de que nosso corpo necessite. Ainda bem que podemos resolver, à dentadas, esse imbróglio alimentar que nos angustia.

domingo, 2 de outubro de 2011

SERIA O LIVRO DE JÓ A DESCRIÇÃO DE UM PROCESSO INICIÁTICO?

Certamente o livro de Jó tem características especiais. É classificado pelos estudiosos da literatura bíblica entre os livros sapienciais do Tanach (Velho Testamento) e como tal, não trata dos temas veterotestamentários tão caros a Israel como a Eleição, a Aliança ou a Lei, mas de uma experiência pessoal. É também o único escrito em forma de diálogo. 

Os que supõem que tenha sido escrito durante o Exílio Babilônico, vêem essa excepcional obra, como uma revisão da teologia da retribuição, espécie de toma lá, dá cá, entre Deus e o povo de Israel, que havia perdido tudo, inaugurando um novo pensamento sobre o relacionamento entre o homem e Deus. Na teologia cristã, o Justo Jó é visto como exemplo de paciência perante a adversidade, de persistência na fé (veja-se Tiago, 5:11).

Dentro do enfoque teológico, dois importantes pontos podem ser destacados no livro: satan trabalha em conjunto com Deus, como um dos seus anjos, ao contrário do que ocorrerá no Novo Testamento, onde será retratado como uma das faces da moeda (a outra é Jesus); e a atribuição de tudo a Deus, tanto o bem como o mal, o que é coerente com o fato de que satan ainda não era nome próprio e não competia com Deus pelas almas humanas.

Norman Gottwald em Introdução Socioliterária à Bíblia Hebraica, 1988, faz uma leitura sociocultural da Bíblia, não se prendendo aos possíveis aspectos religiosos do texto. Para ele, a real intenção do autor do livro de Jó seria quebrar o domínio do moralismo e dogmatismo, que então limitava a sabedoria à mistificações, satisfazendo-se em demonstrar que existe sofrimento inocente, cuja explicação, às vezes, está alem de nossa compreensão.

Do ponto de vista psicológico, é interessante notar o que diz Geraldo Moog (1980), não apenas sobre esse livro bíblico, mas sobre toda a saga israelita, que compara ao processo psicanalítico de libertação do determinismo infantil. A seqüência psicanalítica passaria pelas seguintes etapas: desestruturação, encontro emocional e uma reestruturação da personalidade. Israel desestrutura-se tentando se libertar do Egito (sua infância) tem um encontro emocional com Deus no deserto e finalmente alcança a terra prometida. 

Edward F. Edinger (Bíblia e Psique, 1990) concorda com esse tipo de leitura, sugerindo que o conteúdo bíblico, foi, ao longo dos séculos, selecionado pela psique coletiva, apresentando para nós, um compêndio extraordinariamente rico de imagens que representam encontros com o numinoso.

Essa sugestão de leitura psicológica da Bíblia vem de Carl Jung, que em uma de suas obras concentra-se em Jó (Resposta a Jó, 1954) interpretando a narrativa, como se referindo a um processo de crescimento individual, em que o ego em segurança (Jó com suas posses, família e saúde), sofre abrupta mudança (ação de Deus e de satan, como aspectos de uma mesma entidade – o Self), gerando uma crise no individuo. A nova situação causa um mergulho no inconsciente, de onde emergem as figuras dos três amigos com quem dialoga, e finalmente ocorre o que Jung chama de individuação - encontro com o numinoso, o Si-mesmo - que leva Jó a dizer: Eu te conhecia só de ouvir. Agora, porém, meus olhos te vêem (Jó,42,5).

Bem antes dessas interpretações, Helena Petrovna Blavatsky em sua obra, Isis sem véu, escrito em 1877, entendia o livro como a descrição de um processo iniciático, uma narrativa alegórica dos mistérios e da iniciação de um candidato em uma instituição esotérica. O sofrimento do inocente e justo Jó, corresponderia às provas que purificam e que abrem os portais do conhecimento, do encontro da palavra perdida, que não seria outra coisa que a descoberta de Deus dentro de cada um de nós, objetivo de todo processo.

A junção desses dois conceitos – individuação e iniciação – é feita ousadamente por Jean-Luc Maxence, em Jung é a Aurora da Maçonaria, publicado em 2010 ao afirmar que:
 
Para além da questão de saber se a individuação é uma iniciação, e se a iniciação, um processo de individuação, trata-se aos nossos olhos de reconhecer que as duas posturas evocam um método de regeneração do individuo...


Fazendo jus ao mistério que cobre toda a Bíblia, o livro de Jó comporta assim, várias interpretações talvez correspondendo aos níveis de compreensão sugeridos pela Cabala, que fala de quatro níveis de aprofundamento do texto: Pshat (o sentido literal), Remez (o sentido alegórigo), Drash (o sentido ético ou religioso) e Sod (o segredo), a alma da Torah, excluindo qualquer leitura simplista do chamado Velho Testamento. Os quatro níveis, ou camadas, corresponderiam ao aperfeiçoamento espiritual por que passam os que se dedicam a estudar a Torah, o que não deixa de ser também uma sequência iniciática.

domingo, 25 de setembro de 2011

ITALIANOS DA FAMÍLIA MARTINI EM MOSSORÓ

Pedro Martini, primeiro filho de Angelo Martini.
Raimundo Nonato da Silva, escritor martinense, escreveu, na série Minhas Memórias do Oeste Potiguar, o livro Estrangeiros em Mossoró e lá registrou a presença de vários italianos ou descendentes que por aqui passaram desde tempos remotos. São doze verbetes incluindo atores, padres e outros com atividades diversas em Mossoró. Dentre eles menciona Antonio italiano e ao referir-se a ele, Raimundo menciona também a figura curiosa da velha italiana, de fala pouco compreensível, pela mistura de português e italiano que utilizava. Penso que ainda alcancei essa velha, ou outra figura feminina da família, com características semelhantes.
 
Fazendo esquina com a Igreja São José, localizada no Bairro do mesmo nome, havia uma casa, muros caídos em algumas partes, possibilitando a passagem da meninada da rua da frente para a rua dos fundos, sem dificuldades. Por lá se aboletou um grupo de italianos vindos, não sabíamos de onde, mas que despertou a nossa curiosidade infantil. Lembro de uma velha, cabelos grandes, autoritária, que falava pelos cotovelos, numa algaravia velocíssima, totalmente incompreensível para mim. Havia vários deles habitando naquela casa. Deixaram descendentes em Mossoró. Mais adiante iria conhecer de perto um deles, seu Raimundo Italiano. Passava religiosamente, à tardinha, em frente à minha casa, na Rua Delfim Moreira, a caminho da Padaria ABC, falando alto e de forma amistosa com todos. Por conversas com meu pai, soubera que nós descendíamos dos Burlamacchi, também italianos, o que nos irmanava.

Agora, voltei ao mesmo local para investigar, que família seria aquela, de que região da Itália seria originária, e colher informações sobre os descendentes. Indicaram-me a senhora Maria Edna, viúva de Raimundo Martins (Dodoca), descendente do clã, moradora na Rua Piano.

A rua mudou de nome recentemente passando a denominar-se Raimundo Martins de Oliveira, homenageando essa velha família italiana que se estabelecera nas proximidades. O Martins do nome é aportuguesamento de Martini, informou-me D. Maria Edna. Seriam originados de Nápoles. De princípio teriam se estabelecido no centro da cidade e posteriormente naquele lugar onde os encontrei quando criança. Martini seria derivado do latim Martinus, presente, sobretudo no centro-norte da Itália. 

Outra pessoa da família, D. Antonia Martins, forneceu preciosas informações genealógicas sobre essa gente. Angelo Martini seria o patriarca do grupo, marido da velha italiana chamada Maria, falecida centenária. Teriam sido pais de dois filhos, Pedro Martins de Oliveira e Antonio Martins de Oliveira. O portuguesissimo sobrenome Oliveira parece indicar cruzamento anterior com gente brasileira, ou aportuguesamento de um outro apelido italiano que tivessem. O Dicionário dos Sobrenomes Italianos, de Ciro Mioranza registra a existência de Olivier, Oliviera, Olivieri e Oliviero, muito próximos do português. Os primeiros descendentes eram apelidados de Italianos (Antonio Italiano, Raimundo Italiano, Francisca italiana, etc.), quase se transformando em um novo sobrenome. Segue um curto esboço genealógico dessa família napolitana que deixou raízes em nossa terra.

F1 - Pedro Martins de Oliveira, o primeiro filho c.c. Rita Bertoldo da Silva, pais de:
N1- Ramiro Martins de Oliveira, que foi pastor da Igreja de Cristo c.c. Francisca Rodrigues, de cujo enlace nasceram dez filhos. É nome de Rua no Bairro Aeroporto.
N2 - Raimundo Martins de Oliveira c.c. Guilhermina, com vários descendentes, entre eles outro Raimundo Martins, que foi casado com Maria Edna, primeira informante com descendência. Há membros desse ramo estabelecidos em Recife.
N3 - João Martins de Oliveira com descendentes em Mossoró e Grossos.
N4 - Marieta Martins de Oliveira c.c. Manoel Alves, pais de Amélia, que foi casada com Cristovão Gurgel da Frota.
N5 - Maria Martins de Oliveira, com descendentes na Bahia.
N6 - Francisca Martins de Oliveira c.c. Sebastião Medeiros, pais de Romualdo, Ranilson e Rosália. Lembro de Sebastião prestando serviços à ESAM, como pintor, falando que era casado com uma italiana. Seu filho Romualdo seguiu-lhe os passos. Ajudou-me a encontrar a casa de D. Antonia italiana, para a recuperação desses dados.
N7 - Fausta Martins de Oliveira c.c. Odilio Pinto,nascido em 13 de agosto de 1920, escrivão e poeta.
N8 – Francisca Martins de Oliveira c.c. Antonio Joaquim da Costa (Rouxinol), pais de D. Antonia Martins, informante, que foi casada com Jorge Silvério de Souza, com os seguintes filhos: Rogéria Martins de Souza, Jorge Henrique de Souza, Luiza Maria Martins de Souza e Antonia Flávia Martins de Souza. De outro relacionamento teve D. Antonia a Regina Martins Dantas.

F2 – Antonio Martins de Oliveira, segundo filho de Ângelo c.c. Luiza Pinheiro e foram os pais de: Adauta, Altina, Alfredo, Valter, Maria Luiza (casada com José de Almeida) e Antonio Martins, falecido durante a II Guerra Mundial.
         
Manuel Correia de Andrade escreveu o livro A Itália no Nordeste, editado em 1992, recolhendo informações sobre as famílias de origem italiana no Rio Grande do Norte, citando os Cicco, os Nesi, os Filizola, os Simonetti, os Pintolli, os Romano, os Farachi, os Toselli e os Babini. Faltaram várias outras famílias, dentre elas essa dos Martini, que agora registro para a história.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

O MUNDO ALÉM DO NOSSO BAIRRO

Robert Kennedy em Natal
Quando eu tinha 14 anos meu pai fez uma puxada na nossa casa, situada à Rua Delfim Moreira, bairro São José. Era uma casa, como se dizia então, com frente de tijolo e fundo de taipa também chamada de pau-a-pique. A puxada era uma extensão do final da  casa, formando uma nova área, onde posteriormente instalamos a cozinha. Funcionava também como área de descanso, uma riqueza. Lembro que em um ano de muitas chuvas, o lado leste da casa permaneceu por alguns dias protegido apenas pela armação de madeira, enquanto nós, qual abelhas, tamponávamos as brechas com barro, lutando contra as águas das chuvas que teimavam em cair ininterruptamente. 
 
As mudanças realizadas em nossa casa, com o sacrificado salário do meu pai, eram sempre recebidas por mim com muita alegria, era sempre um passo adiante. Como quando o piso de tijolo foi substituído por cimento queimado, ou quando a luz elétrica foi instalada. Ainda lembro a primeira noite com luz elétrica, uma verdadeira explosão de luz. A lamparina havia se aposentado para sempre das minhas leituras. 

Naquele dia 23 de novembro de 1963, aos 14 anos, como de costume, devo ter passado o dia jogando futebol em algum lugar do bairro, com um poste de iluminação e outro servindo de baliza e limitando nosso campo. Minha mãe, sempre reclamava que eu só aparecia em casa para comer e dormir, e sua reclamação tinha fundo de verdade. Não lembro a hora exata, mas sei que era noitinha, quando ao mesmo tempo em que admirava o final da construção da puxada, recebia a notícia do assassinato de John F. Kennedy. Naquela idade, meus sentimentos sobre fatos dessa natureza, acompanhavam os sentimentos do meu pai, e estes eram de profunda tristeza. Lembro de que ele cogitava que a notícia poderia não ser verdadeira. Quedei-me também triste e permanecemos com os ouvidos colados ao radio, que confirmava o trágico fim do presidente americano. Por trás da tragédia estaria a URSS e isso iria facilitar o avanço comunista por essas partes do mundo.

Os americanos desenvolviam, então, o programa de assistência denominado Aliança para o Progresso, idéia de Kennedy, visando evitar a influência comunista na América Latina e que seria extinto em 1969 por Richard Nixon. Através do programa eram distribuídos remédios, leite em pó, trigo burgol, que nós chamávamos de bugu, massa de milho, às vezes queijo, às vezes roupas usadas, para as famílias carentes da região. Pode-se dizer que Natal foi bastante beneficiada pelo programa. Em 1963 o Governador Aluizio Alves viajou aos Estados Unidos para negociar diretamente com Kennedy, a construção de casas populares, o que redundou em importante bairro da nossa capital, denominado Cidade da Esperança. Da mesma fonte jorrou também o financiamento para a construção da Escola Estadual Presidente Kennedy, inaugurada por ocasião da visita à Natal, em 1964, do senador Robert Kennedy, irmão do infelicitado presidente. Um amigo meu, com alguma consciência política, dizia que tudo aquilo era feito com o dinheiro que eles haviam roubado do nosso país. 

A figura do jovem presidente americano já estava firmada no nosso imaginário, desde a crise dos mísseis em 1962. Lembro das nossas conversas de garotos, o nosso receio de uma conflagração nuclear, as discussões sobre quem seriam mais inteligentes, os russos ou os americanos. Um dos amigos dizia que o americano havia feito um fio muito fino e desafiou o russo a fazer algo mais fino; o russo teria feito um orifício no fio tornando-o oco...e por aí iam as nossas científicas ponderações e o medo do fim do mundo, que parecia tão próximo, e nós tão jovens para tanta tristeza. Seu Manoel Pedro, bodegueiro, com verve e ignorância, dizia que quando soubesse que o fim do mundo já vinha chegando ali pelo Assú, ele faria um monte de besteiras que nunca havia feito.

Vivíamos uma adolescência absolutamente normal de meninos pobres,escola pela manhã, jogo de futebol pelas ruas no resto do dia, torcendo pelo time do bairro – o Salinista, e as noites na praça da Igreja São José onde uma televisão pública, vez por outra, atacava de Tom Jones, cantando Pussycat, It’s Not Unusual, Dalilah e outras.

Aos poucos tomávamos conhecimento de que estávamos mergulhados no mundo e o que afetava outros países, também nos afetava. As ações e traumas da grande nação do norte tinham repercussões no distante Rio Grande do Norte. Pearl Harbor em 1941,com o posterior envolvimento do Brasil na II Guerra, levando à construção em Natal, da maior base americana fora dos Estados Unidos, e John F. Kennedy com a Aliança para o Progresso e a dor de sua morte prematura. Definitivamente o mundo ia além do nosso bairro.