sexta-feira, 14 de outubro de 2011

ANGÚSTIA ALIMENTAR

Se os nossos ancestrais tiveram problemas com alimentação, foram de natureza diversa daqueles que enfrentam hoje os que a duras penas conseguem o pão cotidiano. É questão indigesta essa da alimentação, pois se tornou difícil escolher o que comer, considerando todas as informações disponíveis. Muitas surpresas se encontram à espreita, nos textos sobre o assunto. Para começo de conversa, todos os alimentos apresentam contra indicações. Incrível, mas é verdade Vejamos alguns exemplos.

O brasileiríssimo feijão, preferido por nove entre dez comedores do país, deve ser consumido com cautela. Primeiro porque, juntamente com frutas e verduras, a leguminosa esta mais enriquecida de resíduos tóxicos, que de nutrientes, e depois, algumas variedades, segundo se lê, apresentariam lecitinas e antitripsina, substâncias com alto poder tóxico que podem levar até a morte. A lectina é uma proteína que causa sérios danos nos mamíferos, como por exemplo a aglutinação de hemácias, e a antitripsina atua de modo a impedir a formação de algumas enzimas importantes para a digestão, entre elas a tripsina.Claro que o cozimento diminui o problema, mas não totalmente. Dispensemos o feijão. Imagine feijoada, cujos componentes adicionados fornecem colesterol e aditivos químicos suficientes para desencadear maléficos processos fisiológicos. Você só consegue piorar esse quadro acrescentando farinha de mandioca, incrementando o processo fermentativo e a produção de gases. Uma beleza!

Arroz, só se não estiver descascado, ou seja, serve apenas o famoso arroz integral, o único que nutre. Carne nem em sonho, ou melhor, pesadelo, pois estão cheias de anabolizantes, além de sua riqueza em putrecina, dentre outras substancias não menos assustadoras, que sugestivamente nos levam à certeza de estar deglutindo um delicioso cadáver.

Prosseguindo nesta linha de análise, pouca coisa vai sobrar. Leite de vaca, nem pensar. Cada mamífero na sua têta. Na vaca só o bezerro, pois as imunoglobulinas podem provocar reações alérgicas em espécies diferentes. Nas proteínas do leite de vaca existem mais de 30 sítios alergênicos, que podem causar problemas como diarréia, cãibras, sangramento gastrointestinal, anemia, erupções cutâneas, arteriosclerose, acne, leucemia, esclerose múltipla, artrite reumática e cáries dentárias. De contra peso o excesso de cálcio pode desandar em cálculos renais e biliares.

Agora imagine o perigo que corremos ao tomar leite com pão e margarina. Verdadeiro atestado de óbito. Além de aumentar a taxa de colesterol, o freguês ainda engole bromato de potássio, capaz de afetar seus registros mnemônicos. E não é só isso. O bromato, durante o cozimento da massa do pão, é convertido em brometo, que é cancerígeno. Quanto a margarina, não fique temeroso de que ocorra alguma explosão no seu manuseio, só porque na sua composição entra um explosivo – o ácido butil hidroxitolueno, parente próximo do TNT. Pelo menos até agora não há notícia de que tenha acontecido. Tampouco os terroristas andaram comprando grandes quantidades de margarina para construir bombas. Quem sabe o ácido sulfúrico, a soda cáustica, e o ácido benzóico, utilizados na fabricação evitem o evento explosivo.

Pelo que se conhece, nem o regime ovo-lacto-vegetariano escapa. Se o lacto pode causar alergia alimentar e cálculos, e os vegetais estão sem dúvida envenenados, poderiam os ovos nos salvar dessa verdadeira conspiração alimentar contra a humanidade? Ledo engano. Também não pode. Os caipira são verdadeiras bombas de colesterol e os de granja nem ovos são, mas óvulos, riquíssimos, segundo se afirma, de antibióticos e hormônios. Agora se o caro leitor desejar se aventurar, por favor, não coma com sal, pois a este se atribui um grande número de males, sendo enfadonho listá-los neste momento.

Há, porém, segundo me asseguram, uma solução simples e ao alcance de todos: a mastigação. Sim, afinal, para que você quer os dentes que sobraram depois de tanto comer açúcar? O ideal é mastigar de 100 a 150 vezes o bocado que se tem na boca. Não se preocupe se não conseguir no início. Espelhe-se nos Macrobióticos. Há quem já tenha conseguido mastigar 1300 vezes um pedaço de cebola. Pela teoria, depois de 150 vezes, não interessa mais o tipo de alimento, pois estes se transmutam em qualquer elemento de que nosso corpo necessite. Ainda bem que podemos resolver, à dentadas, esse imbróglio alimentar que nos angustia.

domingo, 2 de outubro de 2011

SERIA O LIVRO DE JÓ A DESCRIÇÃO DE UM PROCESSO INICIÁTICO?

Certamente o livro de Jó tem características especiais. É classificado pelos estudiosos da literatura bíblica entre os livros sapienciais do Tanach (Velho Testamento) e como tal, não trata dos temas veterotestamentários tão caros a Israel como a Eleição, a Aliança ou a Lei, mas de uma experiência pessoal. É também o único escrito em forma de diálogo. 

Os que supõem que tenha sido escrito durante o Exílio Babilônico, vêem essa excepcional obra, como uma revisão da teologia da retribuição, espécie de toma lá, dá cá, entre Deus e o povo de Israel, que havia perdido tudo, inaugurando um novo pensamento sobre o relacionamento entre o homem e Deus. Na teologia cristã, o Justo Jó é visto como exemplo de paciência perante a adversidade, de persistência na fé (veja-se Tiago, 5:11).

Dentro do enfoque teológico, dois importantes pontos podem ser destacados no livro: satan trabalha em conjunto com Deus, como um dos seus anjos, ao contrário do que ocorrerá no Novo Testamento, onde será retratado como uma das faces da moeda (a outra é Jesus); e a atribuição de tudo a Deus, tanto o bem como o mal, o que é coerente com o fato de que satan ainda não era nome próprio e não competia com Deus pelas almas humanas.

Norman Gottwald em Introdução Socioliterária à Bíblia Hebraica, 1988, faz uma leitura sociocultural da Bíblia, não se prendendo aos possíveis aspectos religiosos do texto. Para ele, a real intenção do autor do livro de Jó seria quebrar o domínio do moralismo e dogmatismo, que então limitava a sabedoria à mistificações, satisfazendo-se em demonstrar que existe sofrimento inocente, cuja explicação, às vezes, está alem de nossa compreensão.

Do ponto de vista psicológico, é interessante notar o que diz Geraldo Moog (1980), não apenas sobre esse livro bíblico, mas sobre toda a saga israelita, que compara ao processo psicanalítico de libertação do determinismo infantil. A seqüência psicanalítica passaria pelas seguintes etapas: desestruturação, encontro emocional e uma reestruturação da personalidade. Israel desestrutura-se tentando se libertar do Egito (sua infância) tem um encontro emocional com Deus no deserto e finalmente alcança a terra prometida. 

Edward F. Edinger (Bíblia e Psique, 1990) concorda com esse tipo de leitura, sugerindo que o conteúdo bíblico, foi, ao longo dos séculos, selecionado pela psique coletiva, apresentando para nós, um compêndio extraordinariamente rico de imagens que representam encontros com o numinoso.

Essa sugestão de leitura psicológica da Bíblia vem de Carl Jung, que em uma de suas obras concentra-se em Jó (Resposta a Jó, 1954) interpretando a narrativa, como se referindo a um processo de crescimento individual, em que o ego em segurança (Jó com suas posses, família e saúde), sofre abrupta mudança (ação de Deus e de satan, como aspectos de uma mesma entidade – o Self), gerando uma crise no individuo. A nova situação causa um mergulho no inconsciente, de onde emergem as figuras dos três amigos com quem dialoga, e finalmente ocorre o que Jung chama de individuação - encontro com o numinoso, o Si-mesmo - que leva Jó a dizer: Eu te conhecia só de ouvir. Agora, porém, meus olhos te vêem (Jó,42,5).

Bem antes dessas interpretações, Helena Petrovna Blavatsky em sua obra, Isis sem véu, escrito em 1877, entendia o livro como a descrição de um processo iniciático, uma narrativa alegórica dos mistérios e da iniciação de um candidato em uma instituição esotérica. O sofrimento do inocente e justo Jó, corresponderia às provas que purificam e que abrem os portais do conhecimento, do encontro da palavra perdida, que não seria outra coisa que a descoberta de Deus dentro de cada um de nós, objetivo de todo processo.

A junção desses dois conceitos – individuação e iniciação – é feita ousadamente por Jean-Luc Maxence, em Jung é a Aurora da Maçonaria, publicado em 2010 ao afirmar que:
 
Para além da questão de saber se a individuação é uma iniciação, e se a iniciação, um processo de individuação, trata-se aos nossos olhos de reconhecer que as duas posturas evocam um método de regeneração do individuo...


Fazendo jus ao mistério que cobre toda a Bíblia, o livro de Jó comporta assim, várias interpretações talvez correspondendo aos níveis de compreensão sugeridos pela Cabala, que fala de quatro níveis de aprofundamento do texto: Pshat (o sentido literal), Remez (o sentido alegórigo), Drash (o sentido ético ou religioso) e Sod (o segredo), a alma da Torah, excluindo qualquer leitura simplista do chamado Velho Testamento. Os quatro níveis, ou camadas, corresponderiam ao aperfeiçoamento espiritual por que passam os que se dedicam a estudar a Torah, o que não deixa de ser também uma sequência iniciática.