sábado, 16 de julho de 2011

MÁXIMA MARIA DA CONCEIÇÃO

Se perguntarem aos historiadores mossoroenses, quem foi essa senhora, talvez ninguém saiba. Lembrar-se-ão das matriarcas Firmiana Rosa dos Prazeres, da família Camboa, de Ana Maria, dos Guilherme de Melo, de Leocádia Barbosa Vasconcelos, dos Alves de Oliveira e Camboa, ou de Tereza Maria de Jesus, da família dos Ausentes, primeiras que por aqui se estabeleceram a partir de 1750. De origem jaguaribana, Máxima estabeleceu-se no Sitio Picada, nas várzeas do Apodi e seu nome aparece de passagem na história da cidade.  

O ancestral da primeira família mencionada acima foi Manoel Nogueira de Lucena, de origem pernambucana, sem dúvida descendente de Vasco Fernandes de Lucena por lá estabelecido no início da colonização. A tradição mossoroense registrou 12 filhos que teve com sua esposa Firmiana Maria dos Prazeres. Francisco Augusto, genealogista cearense, descobriu-lhe mais dois filhos de nome Joana Maria Calado e Francisco Ribeiro de Souza, que repete o nome de seu avô materno. 

Felix de Souza Nogueira, o quinto filho de Manoel Nogueira, andou lá pela Picada e conheceu Máxima Maria, que fazendo jus ao nome concebeu do filho do patriarca, gerando a Manuel Felix Calado. Não devia ser muito longe a morada dessa senhora, ou as paixões eram muito exaltadas, pois outro filho de Manoel, o sétimo, Antonio Nogueira de Lucena, descobrindo o caminho da Picada, emprenhou também Máxima, por ser ela o máximo ou quem sabe a única da região para esses serviços extras, pois Antonio era casado. O menino recebeu o mesmo nome do pai e casou depois com sua prima, Maria Soares de Lucena, primeira a ser batizada na nova capela de Santa Luzia, em 1773. Vai longe a descendência desses dois filhos de Manoel Nogueira com Máxima, em Mossoró e adjacências.

Picada: caminho aberto em mata fechada. Feitas a facão. Formavam as comunicações entre as localidades, entre os sítios. As picadas foram muitas naquela época: Boca da Picada, Picada do Livramento, Sitio Picada, dentre outras, mas os filhos do patriarca nunca erravam a picada, não se perdiam no caminho, achavam sempre a Máxima.

De Felix, Francisco Fausto diz apenas que existem descendentes seus em linhagens. De Antonio, a descendência está registrada. Gente ilustre como seu bisneto Capitão Targino Nogueira de Lucena, Vereador, Juiz de Paz, Delegado de Polícia, Administrador da Mesa de Rendas Estaduais, proprietário, negociante, criador, agricultor na cidade de Mossoró. E também os Nogueiras do Sítio Trapiá. 

Acredito que outros bons rapazes, da antiga Mossoró, também eram treinados na picada. Foi o caso do português José da Costa de Oliveira Barca, que por aqui vivia, vindo de Pernambuco. Também se divertia lá pelo Sitio, e dessas visitas a Máxima nasceu João Ferreira da Costa (ou Butrago). Este, de má índole, seria coadjuvante, juntamente com o seu inimigo figadal, padre Longino (dos Guilherme de Melo), das peripécias mais sangrentas da Ribeira do Mossoró. A descendência deste é grande, pelo seu casamento com Quiteria Rita, dos Alves de Oliveira. Foram seus filhos: João Ferreira da Costa Jr. Acursio Ferreira da Costa, Maximiano Ferreira da Costa e Antonio Ferreira da Costa.

E assim, com essa curta crônica genealógica, politicamente incorreta, resgato o nome dessa que pode ter sido a primeira prostituta de Mossoró, mas que pela força da biologia e da genética, é igualmente uma de nossas matriarcas. Intelectuais e políticos mossoroenses originaram-se do seu útero. O que aqui registro é apenas o pouco que ficou a descoberto na nossa genealogia. 

Mas que não haja constrangimento em descender de Máxima, afinal Jesus também descendia de uma prostituta – Raab, prostituta de Jericó, a segunda mulher mencionada na sua confusa genealogia, a primeira é Tamar, que usou de um estratagema para fornicar com Judá.

sábado, 2 de julho de 2011

UM RETRATO DE MEU PAI

Nestor Burlamaqui à direita.
Meu pai era um cara simples como a maioria dos pais. Não foi nome de rua nem de praça, embora por dever de ofício, como militar, tenha participado de fatos importantes, durante um tumultuado período da nossa história recente. Estimulado por algumas memórias familiares e à vista de velhos documentos, tracei a trajetória que aqui exponho nesta curta nota.


Nestor Filgueira Burlamaqui nasceu a 06 de setembro de 1909 em Areia Branca, mas bem que se poderia dizer mossoroense, pelo muito tempo que aqui viveu. Era filho do piauiense Tibério Cesar Conrado Burlamaqui, poeta que fora Presidente da Intendência de Areia Branca no período de 1899 a 1901 e de Luiza Filgueira, mossoroense.

Ainda jovem foi para o Sul do país. Questionado sobre isso contou-me que trabalhava em uma padaria de seu irmão Edgar, quando decidiu sair de Mossoró, viajando inicialmente para sua cidade natal e de lá embarcando para o Rio de Janeiro.

De fato, há o registro de sua matrícula na Marinha Mercante, feita na Agência de Areia Branca, em 18 de março de 1929, aos 19 anos. Um ano depois se alistou no Exército Brasileiro, no Rio de Janeiro. Seu Certificado de Reservista de 1ª Categoria mostra que serviu no 2º Regimento de Infantaria, tendo sido incluído em 09.10.1930 e excluído por conclusão de tempo em 31.07.1937. Dizia que era Cabo telegrafista, o que é compatível com a informação oficial: era Segundo Cabo telefonista.

A reforma do Exército de 1908, reuniu quatro Companhias do 38º Batalhão de Infantaria, de Niterói e mais uma do 32º Batalhão, de Vitória, passando a constituir o 2º Regimento de Infantaria, com sede no Rio de Janeiro.

Durante o seu tempo de serviço participou de dois importantes eventos históricos: a Revolução Constitucionalista de 1932, e a Intentona Comunista de 1935. No primeiro caso, seu Regimento foi chamado a integrar as forças legais que se deslocaram para São Paulo. No segundo caso, foi mandado contra o quartel do 3º Regimento de Infantaria, na Praia Vermelha, na cidade do Rio de Janeiro, foco da sublevação comunista na Vila Militar, que foi dominado em menos de 10 horas, com o sacrifício de 20 mortos entre os revoltosos. As atrocidades aí cometidas fizeram-no anticomunista. Como conseqüência, viu com bons olhos o advento da Revolução de 1964. 

Inúmeras vezes ouvi suas narrativas das ações de que participara, mas que agora não consigo identificar a qual evento se referia. Destacava principalmente o espírito de corpo do Regimento e a camaradagem que existia entre todos os soldados. Dessa época restaram algumas fotos sem data e identificação dos companheiros de farda. Uma delas em frente ao Monumento à Independência do Brasil, também chamado de Altar da Pátria, em São Paulo.

Imediatamente após seu desligamento do Exército, antes de retornar ao Rio Grande do Norte, trabalhou por curto período na Light. Sua Caderneta de Emprego (para a caixa de aposentadoria e pensões dos serviços de tração, força, luz e gás do Rio de Janeiro) data de 20.12.1937 e menciona que morava na Rua João Vicente, 111, Madureira. 

Informa ainda aquele Certificado de Reservista, que a partir da dispensa passaria a residir em Natal, à Rua Prudente de Morais, 786. Esse período em Natal, talvez corresponda ao de suas atividades na base aérea americana - Parnamirim Field - hoje Base Aérea de Natal – o famoso Trampolim da Vitória, onde dizia que teria trabalhado com americanos, vindo daí seu conhecimento de algumas palavras e frases em inglês, que vez por outra gostava de pronunciar. Houve época em que foi estimulado a buscar direitos, que supostamente teria por ter trabalhado em praça de guerra, durante a 2ª Grande Guerra.

Em 1940 procurou reativar seu vínculo com a Marinha Mercante, tendo solicitado uma segunda via de sua Caderneta de Matrícula para Tráfico, na Agência de Areia Branca, tendo que pagar os vistos atrasados correspondentes aos anos de 1931 a 1940. No carimbo do visto anual de 1943, menciona-se que morava em Natal. No visto de 1945, havia ascendido à categoria de Moço.

Em 01.08 de 1943, por influência do Desembargador Dionísio Filgueira, à época assumindo o Governo do Estado, foi admitido na função de Agente Fiscal da Prefeitura de Mossoró. Em 16.12.1952, foi exonerado desta função e nomeado Administrador do Cemitério Público e nesta função aposentou-se em 1969. 

A experiência na caserna tem influência duradoura. Minhas mais antigas lembranças de material impresso são de revistas com fotos de cunho militar. Em uma delas, uma foto de alguns japoneses rendendo-se aos americanos. Depois vieram os quadrinhos inesquecíveis. Homem que é homem não bebe água, bebe chumbo derretido, costumava brincar o meu pai. Afirmava que São Paulo queria se separar do Brasil e por isso houve a guerra de 32. Pelas virtudes militares votou no Marechal Teixeira Lott para Presidente da República, em 1960, contra Janio Quadros. Lembro de uma pequena espada, espécie de alfinete da campanha do militar. Jânio usava uma vassoura – o homem da vassoura vem aí, dizia o jingle janista. Janio ganhou a campanha e mergulhou o Brasil no abismo.

Quando voltei do mestrado ele me falou que estava adoentado.Pensou que era tuberculose, era câncer de pulmão. Operado em Fortaleza, faleceu logo após ser cirurgiado, no dia 23 de março de 1979, um pouco antes dos seus 70 anos. Um mês depois nasceu meu primeiro filho, seu primeiro neto que recebeu o nome de Nestor, em sua homenagem. 

A informação do Exército sobre sua conduta resume seu comportamento na vida: Penas disciplinares: Nenhuma; durante o tempo em que serviu neste regimento demonstrou optima conduta.