No período pré-vestibular, a galera costumava passar rapidamente no que chamávamos de “quartinho de Manoel”, localizado à Rua Marechal Floriano, Bairro Paredões. Era, na realidade, a oficina serigráfica de Manoel Neto de Souza. Frequentavam o “quartinho”, Francisco Bezerra Neto, Hélio Rodrigues de Souza, Maurício de Oliveira, Junior Palheiros que morava vizinho, Messias, Nicodemos dentre outros. Quando chegava por lá, por gozação, sempre dizia que o que estavam estudando não iria cair no vestibular. Chegava montado em minha velha bicicleta Göricke. Atrapalhávamos Manoel no seu trabalho cotidianamente, conversando sobre os mais variados assuntos. Lembro do dia em que o Helio chegou entusiasmadíssimo com uma música que ouvirá. Nada menos que “Na hora do almoço”, de Belchior.
Um dia, o assunto foi uma prova de Matemática do vestibular anterior da ESAM. Todos haviam resolvido as questões sem problemas e se gabavam do feito. Isolei-me por um momento com a prova e tomei um grande susto. Achei que não conseguiria resolver quase nenhuma das questões de Álgebra. Voltei apavorado para casa. No pouco tempo que ainda tinha, debrucei-me sobre o livro Curso de Matemática, de Manoel Jairo Bezerra, procurando recuperar o prejuízo.
O livro de Manoel Jairo Bezerra era o melhor que tínhamos. Em suas mais de seiscentas páginas cobria toda a Matemática do segundo grau. Devido a esse grande volume era conhecido no Rio de Janeiro como “tijolão”, e em São Paulo, como “bezerrão”. O que poucos sabiam, porem, era que o autor nascera em Macau, aqui mesmo no Rio Grande do Norte.
Não me envergonho de dizer que não tinha condições de adquirir, nenhum dos livros necessários, para uma boa preparação para o vestibular. Física e Química, estudava nos livros da Biblioteca Municipal; Biologia, em um livro de Manoel, quando estava disponível. Pouca dificuldade tinha com Português. O “tijolão”, sim; o “tijolão” eu possuía. Ele me viera numa troca por um velho rádio receptor. Na indefinição profissional em que vivíamos, alguns de nós pensávamos em nos tornar radiotécnicos: Eu, Carlos Nunes, Abdenego (até hoje gosto de rádio). Foi com esse último que realizei a troca. Rádio pra lá, “tijolão” pra cá.
No início deste ano li por acaso, notícia velha de meses, que o professor Manoel Jairo Bezerra havia falecido em 2010, no Rio de Janeiro, aos 90 anos e vieram-me estas lembranças.
Manoel Jairo nasceu em Macau, mas a força da necessidade o levou inicialmente a Natal, onde cursou o ginasial no Colégio Santo Antônio. Aos 15 anos mudou-se para o Rio de Janeiro, onde com a ajuda de amigos fez o Curso Complementar para Engenharia da Escola Politécnica e em 1943 conclui o bacharelado de Matemática. Foi professor de matemática de vários colégios do Rio de Janeiro entre eles o Colégio Pedro II, o Colégio Metropolitano, o Instituto de Educação e o Colégio Andrews. Alem do “tijolão” escreveu outros 50 livros, e participou ativamente do Movimento da Matemática Moderna – MMM.
Todos os frequentadores do “quartinho de Manoel”, que competiram naquele ano de 1973, passaram no vestibular: Manoel Neto de Souza, Hélio Rodrigues de Souza, Marcos Filgueira, Francisco Bezerra Neto e Mauricio Oliveira, os três últimos se tornaram professores da ESAM/UFERSA. Todos estudaram com o prof. Manoel Jairo Bezerra, através do seu grande livro. Essa crônica atrasada é homenagem e despedida àquele que dedicou a vida inteira à ciência dos números.
Ah, ia me esquecendo. Depois do susto, minha maior nota no vestibular foi em Matemática.
Que excelente Texto , Professor e Mestre Manoel Jairo Bezerra merece uma caneta, por nos da a honra de seus Livros.
ResponderExcluirEstudei um bocado no "Tijolão" e depois, meus filhos usaram para estudar quando foi sua vez. É um livro inigualável.
ResponderExcluirQuem nas decadas de 50 até 70 não estudou pelo TIJOLÃO ?
ResponderExcluirMuito bom!!
ResponderExcluirJairo