quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

INESPERADO REENCONTRO COM O XADREZ




Costumo iniciar minha busca, na livraria do Shopping, pela estante dos livros esotéricos, onde posso encontrar algo sobre Maçonaria; ao lado estão os livros de auto-ajuda e depois, livros de Psicologia. Daí, passo rápido, mas sempre, nos livros de ensino de línguas e finalmente chego à saída, aos livros de literatura. Nesse setor, observava pela enésima vez, que agora pocket book significa livro escrito em língua estrangeira. Veja por exemplo que um dos volumes aí expostos – Fall of Giants, de Ken Follett, tem quase mil páginas, e The Lost Simbol,de Dan Brown, mais de quinhentas. Definitivamente não são livros de bolso. Enquanto assim pensava, fui surpreendido por um rapaz que até então se mantivera sentado, lendo calmamente.
- Senhor, por favor, desculpe. Por alguma razão acho que o senhor joga Xadrez, me desculpe se o estou incomodando. Respondi-lhe:
- Tudo bem, não, não jogo. Isto é já joguei bastante no passado, mas agora já não jogo.
Passou então a dizer que estava na cidade para estudar e que, como todo aficionado pelo jogo, estava querendo conhecer outros jogadores locais. Falou ainda sobre sua estadia em Natal, onde encontrara um bom ambiente enxadrístico. E completou:
- Se o senhor quiser, estou com o tabuleiro aqui e poderemos jogar uma partida. Faz dias que não jogo.
Não aceitei o desafio. Expliquei-lhe que já fora, talvez, um jogador regular, tendo estudado bastante e possuindo ainda vários livros sobre o assunto, mas agora já não jogava.
Terminada a conversa despedimo-nos. Sai da livraria sem me identificar e sem saber o nome do meu interlocutor. Segui para o cumprimento fiel do restante do nosso ritual de família de classe media baixa, sem muita opção, aos domingos no único Shopping Center da cidade: almoçar, ir à livraria, visitar as lojas de variedades e finalmente o cafezinho.
Nós os mais idosos, vamo-nos transformando em baús de memórias. O diálogo trouxe-me de volta todo o prazer que proporciona esse jogo milenar. As lendas que envolvem o jogo, as idiossincrasias dos campeões, os estudos das aberturas, do meio-jogo e dos finais, algumas disputas, vieram rápidos à memória. Em especial lembrei-me de um determinado autor que fora objeto de minhas leituras constantes: Ludek Pachman. Seus livros Estratégia Moderna do Xadrez – sobre o meio jogo, e Práctica de los Finales en el Ajedrez, foram ambos exaustivamente utilizados por mim.O primeiro considerado pelo autor como o seu melhor livro. Ludek, por suas atividades políticas na década de 70, sofreu o diabo nas mãos dos comunistas checos, até que foi permitido que emigrasse para a Alemanha Ocidental.
Lembrei-me, ainda, que muito depois de já ter abandonado a prática, mantive um programa de Xadrez no computador, mas fui perdendo as partidas cada vez mais rapidamente até que deixei pra lá. A conversa inusitada e o convite, algo desesperado, desse rapaz, acordou em mim todo esse universo quase esquecido. Quem sabe, mais adiante, volte a praticar o Chaturanga. Pelo menos para manter afastado aquele velho senhor alemão que ameaça a todos no final da vida – o tal de Alzheimer.

8 comentários:

  1. Muito boa a história..
    Acho que é assim que as coisas acontecem nas nossas vidas. De uma maneira cíclica.
    De tempos em tempos temos a certeza de que fizemos e sentimos coisas legais no passado.
    Não tenho dúvidas que esse diálogo inesperado com esse jovem o fez lembrar da época em que jogava xadrez e com quem jogava.

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  2. Olá primo ! Gostei de reencontrá-lo neste mar se não grego, o da web. Xadrez é um dos nossos projetos do Vida, nosso Professor Átila inclusive é arbitro e viaja com esta finalidade. Qdo vier a Natal poderá ir em sua Academia, terei o maior prazer. Os demais bem?. Eu sigo o curso das acontecências... rs.

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  3. Caro amigo André,sucesso.É verdade,a vida é cíclica e vem em ondas:as vezes estamos no pico, depois descemos, mas continuamos nadando.

    Minha querida prima Ana Luiza,nós bem que somos exemplos desses ciclos,não?Quero sim conhecer a Academia.Todos bem por aqui.

    Tenho visitado o Facebook de ambos, abraços.

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  4. Pobre rapaz!
    Percebemos quão simples e barato era o seu desejo. No entanto, ninguém para uma partidinha de Xadrez em Mossoró. E ele já estava com o tabuleiro. Espero que tenha encontrado alguém ou que mude logo de hobby.

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  5. Lembranças que trazem lembranças. Lembro de papai me ensinando a jogar Xadrez. Nunca ganhei dele, e ate certo tempo nunca tinha perdido para nenhum de meus amigos. Papai eram bom :)
    Lembro que assim que aprendi, me vi várias vezes como o "pobre rapaz", talvez ate pior. Pagava Nestor pra jogar comigo. 10 anos de idade e pagando o irmão pra poder jogar mais uma. :D Coisa de nerd.
    Ainda bem que hoje existem os jogos em rede. Uma ótima ideia é jogar por e-mail, cada um faz a sua jogada quando tiver tempo e de onde estiver. Com acesso a net ate pelo celulares, fica fácil aproveitar as filas, e esperas da vida para pensar e fazer a próxima jogada. Pena que é fácil de trapacear mas ai perde toda a graca.
    Sugiro o:
    http://gamesbyemail.com/

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  6. Formidável meu grande mestre e amigo, não tenho dúvidas que a vida é assim(ciclica),por isso torna tão interessante,nada é por acaso,acredito que haja realmente esse sincronismo entre as pessoas e os acontecimentos do cotidiano.espero que volte a jogar, e quem sabe marcamos uma partidinha num é mesmo?

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  7. Caro Fabiano, um abraço meu irmão.Logo nos veremos.

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  8. Isso me faz pensar que Mossoró - e talvez Natal também - tem perdido, ao longo dos anos, práticas intelectuais valiosas. Lembro-me que na rua daqui de casa jogávamos, ainda adolescentes, infindáveis e competitivas partidas de xadrez nas calçadas. Hoje em dia acredito isso ser quase impossível. Parece que a moda atual entre os mais jovens exclui essas práticas como se ser "nerd" ou intelectual é estar por fora. Enfim, é algo a ser pensado.

    PS: Só queria lembrar de onde Aquiles, com 10 anos de idade, arranjava dinheiro pra me pagar pelas partidas.

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