terça-feira, 14 de junho de 2011

DE MOCHILAS E MENINAS

Aos nove anos, esqueci minha pasta escolar na bodega de Zé Henrique. Voltei rápido. Ela se encontrava sobre o balcão tal qual deixara. Não teria sido grande o prejuízo. Dentro dela apenas um ou dois cadernos, talvez um livro, lápis, borracha, coisas assim. Recordo-me pelo susto que tomei, nunca gostei de perder coisas. Ela era preta e de tamanho normal. Carregava-a pela alça, ao meu lado esquerdo (sou atrapalhado, destro na mão, sinistro no pé). Lembro que as meninas carregavam seus livro e pastas contra o peito, abraçando-os.

Em um número bem antigo da Science aprendi que algumas macacas tem o comportamento chamado de “carregar”. Levam seus filhotes e outros objetos contra o corpo, como as meninas dos humanos quando carregam suas bonecas e livros.Não lembro se 
naquele trabalho são citadas como destras ou sinistras.

Ontem vi quatro adolescentes saindo da escola. Três meninos e uma menina. Conversavam alegres e saltitantes até o quanto podiam, pois conduziam nas costa pesadas mochilas – as práticas, mas deselegantes pastas escolares atuais. A menina curvava-se muito para equilibrar todo aquele peso de talvez uns 10 quilos de material escolar.

Meninas conduzindo objetos contra o peito são mais femininas. Meninas conduzindo mochilas de 10 quilos nas costas, curvadas para frente, parecem outra coisa, são menos meninas. Nem estou lembrando das conseqüências físicas: cifose (corcunda), escoliose (desvio lateral) e lordose (desvio para cima no final da coluna). Não gosto de ver. Minhas filhas falam que as mochilas são práticas. Eu retruco – para viagens.

O padre que ensinava Francês no Estadual, depois de muito le plafond e le planchet, nos ensinava que mon cahier est dant ma seviette , e depois que ma seviette est sur la table. 

Seviette, pasta escolar em Francês. Serviette que naquele tempo eu carregava do meu lado esquerdo, e a menina de cabelos soltos, sorriso franco e inocente, carregava abraçando contra o peito, adocicando meu coração.

O padre não usava batina já naquele tempo. Tempo em que eu só era aprovado nas línguas – Português, Francês e Inglês - pois o futebol, responsável pelas minhas centenas de faltas, não me deixava avançar nas outras matérias. Aquele padre casou. Mesmo não usando batina, a gente dizia que ele havia deixado a batina para se casar. Não sei se sua musa carregava sa seviette contra o peito, na sua época de estudante ou mesmo depois, mas é bem provável que sim. Se ela carregasse uma mochila com 10 kg nas costas, duvido que tivesse cativado o padre. Logo ele com voto de castidade (alguém me lembrou que agora, época de mochilas nas costas, os padres são outros).

Mochila só para viagens, galáxias afora, se for o caso. Menos mal que meninos conduzam mochilas de dez ou mais quilos nas costas para a escola, como carregadores. As meninas não. É prático, mas não é bonito. Não gosto de ver.  Aposto que aquele padre, como eu, amava a diferença. Ele teria ensinado: Vive la différence!

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