sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

MESTIÇO É QUE É BOM!



Há algumas semanas fui com minha esposa à Livraria Potylivros, localizada na UERN e comprei o livro Mestiço é que é bom! O livro é baseado em uma longa entrevista com Darcy Ribeiro, feita, em 1995, por vários intelectuais, A ciência tem demonstrado isso. Pesquisa feita pela Universidade de Cardiff, na Grã-Bretanha, sugere que as pessoas mestiças são vistas como as mais atraentes. E cita o caso da atriz Halle Berry, a que acrescento, por conta própria e risco, para ficar no mundo das atrizes, a belíssima Jennifer Lopez.  Mas o ponto de vista de Darcy, diz respeito à composição étnica do brasileiro, fadado, segundo ele, a constituir uma nova civilização nos trópicos. Diz ele: Somos melhores porque lavados em sangue negro, em sangue índio, melhorado, tropical.

Agora, neste fevereiro de 2011, noticia-se que uma pesquisa realizada com 934 pessoas representativas das várias regiões brasileiras, conduzida pelo geneticista Sergio Pena e equipe , mostra o quanto estamos realmente mestiçados. Afirma Pena, em entrevista à Folha de São Paulo, que isso seria o resultado da chamada política do branqueamento, defendida por estadistas e intelectuais nos séculos XIX e XX. Destacam, também, o que já sabíamos, isso é, que os genes da cor da pele e dos cabelos, são muito poucos, parte desprezível da herança genética, embora seu efeito seja muito visível, mas por baixo da pele, somos bem uniformes. 

Chamo a atenção para os dois extremos da pesquisa. A amostragem daqueles que se identificaram como brancos no Rio Grande do Sul, por mais branquelos que fossem, apresentaram 5,3 % de genes africanos, e na Bahia, a morena mais frajola, possui, por mais escura que seja sua pele, 53,9 % de genes europeus. Nenhum isento de sangue índio. 

Em 1991, publiquei, no jornal Tribuna do Assu, um artigo intitulado Da Inferioridade Negra, onde procurava mostrar, a irracionalidade do racismo entre nós. Louvava-me, em pesquisa com resultado semelhante, já produzida pelo mesmo cientista, publicada na Ciência Hoje, nº 50 de 1989, para mostrar o quanto estávamos misturados e quão errados estávamos em considerar inferiores os de pele escura.Em determinado ponto do artigo disse: 

Nesse fim de século, confirmando uma previsão do Presidente Roosevelt, os  Estados Unidos da América, assumem, solitários, a posição de xerifes do mundo. É a potencia maior. Pois não deveria ser, se os negros fossem de fato inferiores como insensatamente ainda insistem alguns. 

Destaquei, então, as figuras negras que dirigiam a capital Washington e as forças armadas daquele grande país do Norte. Naquele ano, o mestiço Obama acabava de se  formar em Direito na Universidade de Harvard e nem sonhava em se tornar o cumprimento da profecia de Monteiro Lobato no seu livro O Presidente Negro.
 
Mas que ninguém se engane, Monteiro Lobato, apenas dava asas, no seu romance, às idéias racistas defendidas por Le Bon em L’Homme et les Sociètes (1881) onde afirmava que os seres humanos foram criados desigualmente, e assim, a miscigenação seria um fator de degeneração racial. Idéias, hoje, completamente desacreditadas pela ciência, mas que deixaram raízes profundas nas crenças populares. 

Como muito bem diz o grande antropólogo na entrevista, pela capacidade de miscigenação de portugueses e espanhóis, já lembrada também por Gilberto Freire em Casa Grande e Senzala, estávamos fadados à salutar mistura. Em consequência, diz Darcy, somos hoje, a nova Roma, os representantes dos latinos e coexistiremos, no futuro, ao lado de milhões de árabes, neobritânicos e chineses. A explicação de sermos a continuação dos romanos é feita de forma irreverente:

Somos a maior massa latina. Os franceses ficaram tocando punheta, os italianos bebendo chianti, os romenos com medo dos russos, quem saiu fodendo por aí foi espanhol e português e fizemos uma massa de gente que é de 500 milhões.(pg. 105 de Mestiço é que é bom)

Na entrevista Darcy conta, também, a hilariante tentativa de acasalar-se com uma francesa virgem, que deu em nada, mas essa é uma outra história sobre miscigenação.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

MEUS PETS QUERIDOS


Certa vez conversando com o historiador Raimundo Soares de Brito, fiquei sabendo que ele não cria gatos. Sofreu muito com a morte de um bichano de sua estima e decidiu que essa dor ele não desejava repetir. Eu crio gato e cachorro. Claro que já perdi vários.  Sofri, mas continuo criando. Minha avó tinha uma razão mística para a posse de animais. Dizia que deveríamos ter sempre um animal, para o caso de alguma desgraça cair sobre a família. Segundo ela, o bicho é que pagaria o pato. Uma espécie de garantia sacrifícial. Ainda segundo ela, era para dizer cachorro, cão era o diabo. 

Como tenho dúvidas de qual gosto mais, sempre criei os dois, o que nem sempre dá certo. Dentre os vários que já tivemos, dois foram especiais. Pretuxa, uma cadela preta, companhia adorável, que teve câncer de seio, foi operada, mas a recidiva matou-a, (Não gosto de recordar esse assunto doloroso), e um gato com o estranho nome de Budura, o gato que veio do céu. Não se assustem com o nome, nem me peçam para explicar o significado, não sei, só sei que foi assim. Ele nasceu em cima da casa, foi abandonado pela mãe e despencou pelo pergolado, sendo aparado, “milagrosamente” pela minha filha Tétis. Lembro que ela me fez ir, imediatamente, comprar uma mamadeirinha para salvar o gato, e conseguiu. Fez história por aqui esse cara. Farrista, só chegava em casa pela manhã, todo arranhado e amarfanhado. Acho que se tornou meio humano, abria gaveta, guarda-roupas, geladeira, derrubava a marmita para abri-la, e por aí vai. Garanto que quando forem escritas As Aventuras de Budura, vocês vão se surpreender. Alias, antes que alguém toque no assunto, mais feio que Budura é Nyoca, e nem por isso Hollywood deixou de faturar com suas aventuras. 

A grande imprensa noticiou que um gato foi flagrado, por uma câmera escondida, roubando mais de 600 objetos da casa de moradores da cidade de San Mateo, na Califórnia. O gato chamava-se Dusty. Toalhas, luvas, sapatos, calcinhas e brinquedos estavam entre suas preferências. Duvido que esse delinqüente fosse mais inteligente que Budura. Talvez mais ladrão.

Atualmente criamos um mestiço de Pitibul, e também uma gata, cuja atividade principal é escapar do cachorro. Ela já mapeou a casa e sabe com exatidão por onde não anda o adversário. Não sei até quando resistirá.  Às vezes tem discussões acaloradas: a gata fala baixinho, num bate queixo quase inaudível, o cachorro fala alto. Já tivemos os que se davam bem, como aqueles da foto acima, mas estes não, sempre que se encontram dizem-se cobras e lagartos.   Acho que é a gata que começa o barraco. Eita gata conversadeira, falta pouco para falar de verdade. Outro dia o despertador do celular disparou com aquela voz irritante pra quem esta aposentado – São seis horas, é hora de levantar. Pois não é que a gata foi tirar satisfações com o celular! 

O cachorro, apesar do sangue ruim, é extremamente dócil e bajulador para com os das suas relações. Só é um pouquinho inamistoso com estranhos, já tendo mordido o eletricista, o encanador, o leiteiro, o cara do gás, o da água, o da pizza, e outros que me esqueci agora. Já a gata, como toda fêmea, tem aquela pose de quem-quiser-que-venha-pedir, aliada à soberba que os gatos adquiriram no Egito Antigo. Em compensação, com freqüência vem carinhosamente me atrapalhar no computador. Quer teclar também. Mas só quando ela decide que quer e Penélope, sua preferida, não esta em casa.

Dizem que a criação de animais de estimação é capaz de diminuir o nosso estresse, aumentar os níveis de serotonina, e reduzir a pressão sanguínea, bem como diminuir os níveis de colesterol. Deve ser verdade, pelo sentimento sincero de amor que nos possui nessa relação. Amor desinteressado.

O nosso cachorro se chama Scooby e a gata Nenem, e estranhamente ainda não os vi hoje, será que se mataram? Vou verificar.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

CRENÇAS MÁGICAS DOS JUDEUS PORTUGUESES


Diz uma antiga lenda, contada pelo Rabino Samuel Ibn Virgo em seu livro Tribo de Judá, que um clérigo estudioso, do sec. XI, contara a Afonso, Rei de Castela, que quando Nabucodonosor sitiou Jerusalém, veio-lhe em auxilio o Rei Hispanis, cujo nome corresponderia à Espanha. E quando Jerusalém caiu e houve partilha dos cativos, Hispanis recebeu o quarteirão da cidade, no qual viviam as famílias aristocráticas da Casa de David. Hispanis trouxe-as para a Andaluzia, instalando-as em Toledo, Granada e Sevilha. Complementando esses informes, o também rabino, Itzahak ben Gueint, dizia que vieram à Espanha duas famílias da casa real de David: a família Ben-Daud e a família Abrabanel. A primeira teria se estabelecido em Lisboa e a segunda em Sevilha. Se verdade, estas seriam as raízes dos judeus ibéricos. O profeta Obadias, (Ob.20) escreve: ... e os cativos de Jerusalém, que estão em Sefarade, possuirão as cidades do Negeve”(Ob. 20). Sefarade, na tradição judaica é a Espanha.
O tempo passou, vieram os romanos, os godos, os mulçumanos, e por lá permaneciam os filhos de Israel. Com a reconquista da Espanha das mãos dos mulçumanos e a adoção da política de conversão dos judeus ao catolicismo, veio também a Inquisição, que vai infernizar-lhes a vida de 1478 a 1834.
A desgraça cai sobre os judeus de Portugal, com o decreto de expulsão, promulgado pelo Rei D. Manuel I, em 1496. Para onde foram esses judeus ou cristãos-novos expulsos de Portugal? Foram para o Brasil, Turquia, Marrocos, norte da África, Síria, Holanda e Itália. Muitos permaneceram em Portugal, sendo batizados em pé.
Nos países e regiões onde predominava o Islamismo, como na Turquia, pela tolerância mulçumana, os judeus continuaram sabendo que eram judeus, não perdendo a memória de sua origem e de suas crenças. Nos países sob o jugo católico, como no Brasil, a pressão inquisitorial levou-os ao esquecimento de suas origens, sobrevivendo apenas algumas práticas até hoje presentes no nosso cotidiano. Vem a calhar, a propósito, o trabalho intitulado Tradições mágicas dos judeus otomanos, publicado no nº 37, ano X, da revista Morashá, de onde colho alguns exemplos, que parecem tirados do Nordeste brasileiro. Lá, praticados por judeus, aqui, por aqueles que esqueceram sua origem.
PARA EVITAR O MAU-OLHADO:
- Pendurar ferradura ou dente de alho na entrada da casa ou de uma loja.
SOBRE CRIANÇAS:
- Se alguém passasse sobre uma criança, acreditava-se que esta não cresceria mais.  Assim, se deveria passar de volta para que isso não ocorresse.
- Acreditar que os dentes de uma criança não cresceriam se ela se olhasse num espelho.
- A pessoa que notava pela primeira vez o dente, deveria dar um presente à criança.
PARA EVITAR PROBLEMAS EM CASA:
- Não se deve sentar no lugar do qual alguém se levantou, até que o lugar esfrie.
- Não deixar tesouras aberta.
- Não deixar sapatos virados para baixo.
SOBRE DINHEIRO:
- Se a mão direita coçar vai-se fazer pagamento; se for a esquerda vai-se receber dinheiro
- Se aparecer um circulo no fundo de uma xícara de café, vai-se receber dinheiro.
São apenas alguns casos, dentre tantos publicados naquele trabalho. Com ligeiras modificações, são de conhecimento geral na nossa região, pelo menos pelos mais velhos. Originam-se nos judeus portugueses e permanecem sendo praticados pelos seus descendentes, nas várias regiões do mundo para onde foram forçados a emigrar. Não sabemos mais quem somos, mas continuamos fiéis às antiqüíssimas práticas dos nossos ancestrais.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

O TIJOLÃO DO PROF. MANUEL JAIRO BEZERRA




No período pré-vestibular, a galera costumava passar rapidamente no que chamávamos de “quartinho de Manoel”, localizado à Rua Marechal Floriano, Bairro Paredões. Era, na realidade, a oficina serigráfica de Manoel Neto de Souza. Frequentavam o “quartinho”, Francisco Bezerra Neto, Hélio Rodrigues de Souza, Maurício de Oliveira, Junior Palheiros que morava vizinho, Messias, Nicodemos dentre outros. Quando chegava por lá, por gozação, sempre dizia que o que estavam estudando não iria cair no vestibular. Chegava montado em minha velha bicicleta Göricke. Atrapalhávamos Manoel no seu trabalho cotidianamente, conversando sobre os mais variados assuntos. Lembro do dia em que o Helio chegou entusiasmadíssimo com uma música que ouvirá. Nada menos que “Na hora do almoço”, de Belchior.

Um dia, o assunto foi uma prova de Matemática do vestibular anterior da ESAM. Todos haviam resolvido as questões sem problemas e se gabavam do feito. Isolei-me por um momento com a prova e tomei um grande susto. Achei que não conseguiria resolver quase nenhuma das questões de Álgebra. Voltei apavorado para casa. No pouco tempo que ainda tinha, debrucei-me sobre o livro Curso de Matemática, de Manoel Jairo Bezerra, procurando recuperar o prejuízo. 

O livro de Manoel Jairo Bezerra era o melhor que tínhamos. Em suas mais de seiscentas páginas cobria toda a Matemática do segundo grau. Devido a esse grande volume era conhecido no Rio de Janeiro como “tijolão”, e em São Paulo, como “bezerrão”. O que poucos sabiam, porem, era que o autor nascera em Macau, aqui mesmo no Rio Grande do Norte. 

Não me envergonho de dizer que não tinha condições de adquirir, nenhum dos livros necessários, para uma boa preparação para o vestibular. Física e Química, estudava nos livros da Biblioteca Municipal; Biologia, em um livro de Manoel, quando estava disponível. Pouca dificuldade tinha com Português.  O “tijolão”, sim; o “tijolão” eu possuía. Ele me viera numa troca por um velho rádio receptor. Na indefinição profissional em que vivíamos, alguns de nós pensávamos em nos tornar radiotécnicos: Eu, Carlos Nunes, Abdenego (até hoje gosto de rádio). Foi com esse último que realizei a troca. Rádio pra lá, “tijolão” pra cá.

No início deste ano li por acaso, notícia velha de meses, que o professor Manoel Jairo Bezerra havia falecido em 2010, no Rio de Janeiro, aos 90 anos e vieram-me estas lembranças. 

Manoel Jairo nasceu em Macau, mas a força da necessidade o levou inicialmente a Natal, onde cursou o ginasial no Colégio Santo Antônio. Aos 15 anos mudou-se para o Rio de Janeiro, onde com a ajuda de amigos fez o Curso Complementar para Engenharia da Escola Politécnica e em 1943 conclui o bacharelado de Matemática. Foi professor de matemática de vários colégios do Rio de Janeiro entre eles o Colégio Pedro II, o Colégio Metropolitano, o Instituto de Educação e o Colégio Andrews. Alem do “tijolão” escreveu outros 50 livros, e participou ativamente do Movimento da Matemática Moderna – MMM.   

Todos os frequentadores do “quartinho de Manoel”, que competiram naquele ano de 1973, passaram no vestibular: Manoel Neto de Souza, Hélio Rodrigues de Souza, Marcos Filgueira, Francisco Bezerra Neto e Mauricio Oliveira, os três últimos se tornaram professores da ESAM/UFERSA. Todos estudaram com o prof. Manoel Jairo Bezerra, através do seu grande livro. Essa crônica atrasada é homenagem e despedida àquele que dedicou a vida inteira à ciência dos números. 

Ah, ia me esquecendo. Depois do susto, minha maior nota no vestibular foi em Matemática.